domingo, 21 de julho de 2013

Sobre Redes Sociais, Globalização E O Real Significado Do Verbo "Curtir"




O mundo como conhecemos hoje é moderno, cercado de tecnologias para facilitar nossa vida, para assistir web séries do Super Mario ridículas e que ajudaram a destruir minha infância, para se comunicar, para mentir no trabalho dizendo que estou doente e me esquecer que tenho o supervisor no facebook, que inclusive curte a minha atualização que diz “feriado pessoal”.  

  Daí você pensa que toda essa globalização além de muito positiva, é inteligente, com todo esse acesso a situação tão facilitado. Mas as pessoas esqueceram totalmente o propósito de certas coisas nessa nova era digital. E uma das coisas que perdeu o propósito foras as redes sociais. Sim, porque se pararmos para pensar, em uma situação onde as distâncias são constantemente as maiores possíveis, a telefonia que além de cara não funciona e não há tempo para que tudo seja dito assim pessoalmente, a ideia do facebook, twitter e todo o resto até que faz sentido, como complemento das relações humanas. 

  Mas aí tudo vai por água abaixo muito fácil. Expressar opiniões é algo tão simples e automático. Pior, opiniões prontas, um pensamento que aparece na linha do tempo e parece bom o suficiente para ser adotado por mim, uma ideia que nem foi digerida, mas apenas selecionada e passada adiante. E expressões com significados reais se tornam banais e muito rapidamente: Curtir, compartilhar, seguir, favoritar.

  Você começa a ver que há problema, quando as pessoas começam a viver sua própria Matrix, deixando de sair dos seus lares para investigar assassinatos ou plantar batatas virtuais no mais novo joguinho da moda do facebook. Quando levam um tiro e postam enquanto agonizam, o ocorrido nas redes sociais. E qual o real significado da palavra “curtir”? Curtir deveria ser uma coisa positiva, uma ideia boa de se ver. Mas aí você vê alguém postar que apanhou na rua, perdeu o celular ou que seu cachorro morreu e lá vem dezenas e dezenas de curtidas.

  Isso sem falar nas fotos de comida, nos biquinhos das fotografias tiradas no espelho do banheiro, que ás vezes refletem um vaso sanitário digamos ocupado, no primeiro cocô na fralda do filhinho.  O mais importante é não esquecer da vida lá fora, porque na nova era e guardadas as devidas proporções, as redes sociais são boas encurtadoras de distância. E evite adicionar pessoas do trabalho no facebook, sério mesmo.

domingo, 14 de julho de 2013

Novas Reflexões Sobre Velhice, Legado E O Que Acontece Quando Tudo Fica Preto E Branco


    Todo mundo adora histórias. História pra contar e para ouvir, assim prontinha, de quem fez e viu coisas que você não sonhava existir, que existiram mas que você não vivenciou, ou que são difíceis de acreditar, tipo aquela vez que o amigo do seu avô disse ter visto um chupa-cabra em cima de uma mangueira chupando manga. Além de vegetariana a criatura deve ter poderes místicos ou então estava acompanhada de algum ser da floresta, como a Caipora, porque nem estava no tempo da manga.

  Mas história é história. E quem as vivenciou, ou ao menos teve criatividade suficiente para cria-las, hoje não passa de um vovozinho simpático, que a conta e reconta entre netos, alguns poucos interessados e parentes que só vê no Natal, pessoas que talvez nem seja mais capaz de reconhecer. Só que todos esquecem que entre colírios e fixadores de dentadura, os velhos de hoje foram os jovens de ontem. Que aquele velhinho que hoje sai de casa uma vez por mês e que passa por você na rua, pode ter sido um campeão de boxe, pode ter lutado na Segunda Guerra, pode ter salvado o mundo pelo menos umas três vezes antes mesmo de você pensar em existir, mas hoje é apenas uma figura certa no canto da sala, uma preferência na fila da farmácia.

  O fato é que os velhinhos de hoje foram jovens há 50 anos e outros foram jovens antes deles. E foram nas pequenas e nas grandes coisas que eles deixaram seu legado. Hoje sua tia avô pode não ser a mesma bela visão em trajes de banho na praia, mas ela pode ter sido a primeira no bairro a realizar a proeza de vestir um maiô na juventude dela. O tiozinho que mora no outro lado da rua pode muito bem ter sido o primeiro a ter a ideia de comprar o ingresso do cinema e passar o dia na sala de exibição, para assistir vários filmes pagando pelo preço de um, mesmo que olhando para ele hoje, pareça mais que ele entrou na caravela errada e veio parar aqui. Para o bem e para o mal e para o mundo como conhecemos, foram esses feitos hoje insignificantes que fizeram as coisas caminharem, antes de tudo virar uma enfumaçada lembrança em preto e branco.

  O que acontece quando as teias do Homem-Aranha não puderem mais mantê-lo pendurado nos prédios por aí, quando a armadura do Homem de Ferro enferrujar junto com suas articulações, quando o Batman descobrir que aquela voz estranha que ele tinha era na verdade uma doença de garganta que ele deveria ter tratado ainda na juventude? Provavelmente irão para um canto da sala, em um asilo ou em casa de parentes, virar um artigo de zoológico, visto uma vez por ano, nas férias da escola dos netos.
 
 Por isso nunca deixe de olhar um velho com respeito, mesmo que ele tente te agredir com a muleta durante uma crise de ciúme por você ter ajudado sua esposa de 85 anos a atravessar a rua. Nunca deixe de enxergar nele o brilho e o peso de ter vivido muitos anos a mais do que você e de ter visto e feito coisas que você não poderá fazer. E nunca deixe de tentar entende-lo, mesmo que a história do chupa-cabra na mangueira seja bem difícil de aceitar, sério. 

domingo, 7 de julho de 2013

Invenções Dominicais, Cinema E Uma Ou Duas Ideias Realmente Promissoras De Roteiros De Cinema


  O mundo é desde um bom tempo essa bola azul, repleta de beleza e de problemas. E desde sempre o ser humano buscou uma forma de escapar aos dissabores da vida, embora as ideias por mais variadas que tiveram com esse fim, muitas vezes não fossem as melhores.
  Logo alguém se cansou do tédio e resolveu rabiscar umas paredes na caverna, mas os domingos continuaram ficando cada vez mais chatos e a coisa chegou ao nível onde uma galera se reunia regularmente para assistir algum estrangeiro ser devorado por um leão, cavaleiros se matando ou vinte duas pessoas correndo atrás de uma só bola, talvez para tentar esquecer de suas próprias mães, que ao julgar pelo que a torcida sempre grita, não são as melhores criaturas do mundo.
  Mas no meio de tudo isso e antes de que o Faustão começasse a caminhar sobre a Terra, apareceram as artes, a literatura, a música. E é claro, o cinema. Essa caixa de surpresas, o retrato da vida, o devaneio, o riso e a lágrima, a alegria e também o arrependimento eterno de ter gasto dinheiro para assistir Ted no cinema, tudo isso em um só lugar.
  Poucas pessoas vão saber precisar o porquê de gostar tanto da Sétima Arte. Particularmente gosto da forma com a qual a mentira consegue ser real, do quanto qualquer coisa pode virar realidade diante dos seus olhos e te prova assim, que de alguma maneira existem, por estar ali, na sua frente. E gosto dessa possibilidade constante de um dia fazerem um filme estrelado por uma lhama. Ela usaria uma bandoleira e trajes militares e teria habilidade para matar terroristas usando apenas um rolo de papel higiênico. Mas ainda não sei quem seria o ator ideal para dublá-la.
  Isso sem contar que no fundo, a vida aqui fora é um imenso cinema, uma adaptação de um livro extenso e imprevisível ao qual chamamos de vida. Um lugar onde sonho, realidade e cenas sem sentido aparente se misturam, tipo aquela vez que dois malucos estavam brigando no meio da avenida utilizando as pedras soltas do meio-fio.
  Por tudo isso e muito mais, a postagem de hoje trata de cinema. Uma coisa que o Faustão, palhaços de lanchonete ou o prejuízo que tive assistindo Ted no cinema nunca irão conseguir estragar. E estou disposto a roteirizar a história da lhama, sério.

domingo, 30 de junho de 2013

Sobre Os Pequenos Detalhes Que Fazem Toda A Diferença


    A sociedade em que vivemos nos dá diversas opções de tudo o que queremos. Comida chinesa, sapatos azuis, filmes no cinema, livros, fotos de lhamas voadoras, amigos, profissões a seguir. Tudo isso faz com que nos tornemos mais exigentes e atentos aos detalhes. Em um mundo onde livros custam mais caro do que deveriam, filmes do Bruno Mazzeo estreiam toda semana nos cinemas por causa das leis de incentivo (e ainda cobram 25 centavos em direitos autorais) e pessoas que você conhece na semana passada e que pareciam absolutamente idôneas te oferecem um cogumelo colorido saído dos jogos do Super Mario ou te fazem acordar numa banheira cheia de gelo sem um pulmão, o fígado e com um rim a menos, ser detalhista te possibilita manter mais órgãos no corpo ou encontrar um sapato azul que te agrade.
  Mais um clichê que faz sentido, um detalhe faz toda a diferença. É quando pormenorizamos as situações que percebemos o quanto temos de escolher.  Uma ideia condizente com a sua própria ou um olhar raro de se encontrar pode ser porta de entrada para uma bela estrada com alguém. A lembrança de um pôr do sol de um lugar visitado apenas uma vez pode torna-lo especial e sempre presente em sua memória. Aquele salgado de frango da cantina que parecia estar estragado vai te fazer sempre duvidar de promoções das cantinas de faculdade. E aquele professor tão descolado que deu a entender claramente que passaria todo mundo sem grandes complicações, mas no meio do semestre desapareceu e foi substituído por um monstro sem alma ou coração talvez te faça para sempre achar que deveria tentar levar os estudos a sério.
  Mas como chocolate e tudo o mais que existe nessa vida, tudo demais é veneno. E ser detalhista em excesso pode ser arriscado. Podemos perder um dedo inteiro por lixar excessivamente a unha, que julgamos estar um pouco desigual no canto, embora claro, sempre exista a possibilidade dessa analogia ser péssima. Mas o fato é que embora “detalhismos” sejam bem-vindos por razões cercadas de sentido e já mencionadas (principalmente no tocante às lhamas voadoras), sair procurando detalhes demais pode nos tornar racionais em excesso, fazendo da vida um imenso Criminal Case do facebook e o que é pior, com todas aquelas solicitações. Uma caminhada na praia não vai deixar de ser bonita só porque parece que pisei em cocô de cachorro de pés descalços. Não dá para desprezar as minúcias, na verdade são elas que tornam as coisas diferentes e te fazem ver onde ninguém mais enxerga. Só não dá para sacar uma lupa e correr por aí pormenorizando tudo.
  É por essas e outras que com certeza um detalhe faz toda a diferença. Uma letra errada na sua carteira de identidade pode ser o suficiente para ser detido pela Polícia. Um pênalti marcado por engano pode mudar a história de um jogo e garantir que amanhã não vou precisar ver centenas de bandeiras do Brasil em prédios, automóveis e cachorros pintados de verde-e-amarelo simplesmente porque a Seleção ganhou essa bendita Copa das Confederações. E é claro, pelo simples detalhe da palavra “voadora” na hora de pesquisar lhamas no Google possibilitou essa bela imagem que estampa o post. Mas cuidado com os excessos, para não ver lhamas-unicórnios-rosas-voadoras, embora eu particularmente tenha achado bastante criativo e espero que exista de verdade.

domingo, 23 de junho de 2013

Pequenas Considerações Sobre Morte, Morrer e o Seu Omar

  Acredito que a maioria das pessoas ao olharem o tema da postagem de hoje vão achar estranho. Vão olhar e pensar que o blog deve ter mudado de foco depois que conseguiu seus 20 centavos a menos pela passagem de ônibus e que nesse tempo onde todos andam sacando cartazes pedindo educação, saúde e redução no preço dos shampoos, talvez eu tenha levado um também, pedindo o fim das temáticas sem pé ou cabeça no blog. Nada disso. A postagem pode até não ter um tom mais cômico hoje (talvez), mas não é uma regra e não é por falar sobre morte.
  Interessante essa relação funesta que temos com a morte. Alguns filmes e mais precisamente um livro que li, A Menina Que Roubava Livros, me fizeram parar e refletir acerca da morte. Ela deve mesmo ser um ser, uma entidade, uma criatura. Deve vagar por aí fazendo seu trabalho. Imagino até que trabalhe para Deus e para a Natureza. Um trabalho ingrato e temido, por sinal, mas de extrema necessidade. Eu não consigo observar a morte como aquele ser com rosto de caveira e a foice a tira colo, a não ser que ela venha de uma festa à fantasia.
  A morte deve ter se modernizado nessa virada de milênio. Deve ir trabalhar de terno, saindo de dentro de um belo carro importado. E deve ter empregados, ou melhor, deve ter resolvido terceirizar, de chapeiros de fast food a donos de indústrias de cigarro, tem sempre alguém fornecendo uma bela ajuda para a morte, passando por professores de cálculo com poder de parar o tempo ou o permanente risco diário e iminente de um jogo de golf narrado pelo Galvão Bueno e com transmissão obrigatória em toda a rede nacional, que seria algo que aumentaria consideravelmente a demanda de trabalho dela, dada a onda de suicídios coletivos que causaria.
  Imagino que morte seja um desses assuntos polêmicos, que ninguém quer começar a debater por medo e divergência de ideias, assim como o Neymar na seleção ou a criação de um banco de dados para a venda de vinagre. Mas a realidade é que a morte é uma grande piada, ou ao menos é a lâmpada que acende no bar depois desse grande show de stand up que é a vida.
  Morte também põe comida na mesa, para que o ciclo se complete, acaba que o Sr. Omar e muita gente se encarrega desse negócio. Como tudo nessa vida, ela tem seu aspecto mais brutalizado, porque não pede licença, por vezes, vem sem avisar e deixa um rastro rumo ao desconhecido, é verdade. Mas se até sua tia que aparece no primeiro dia do feriadão faz isso, porque temê-la tanto, por mais difícil que isso seja? Não que a gente vá andar por aí sem olhar para o lado ao atravessar a rua, mas é tentar entender que assim como o professor de Cálculo, ela só quer fazer seu próprio trabalho.

domingo, 16 de junho de 2013

Sobre Histórias Para Contar, Vendedores de Moldura e Os Malucos Que A gente Encontra Na Rua

  
O mundo vem se tornando a cada dia um lugar mais e mais hostil. Há medo nas ruas, raiva nos locais de trabalho e preocupações cerradas na mente de cada pessoa. E tudo isso intercalado com congestionamentos, ônibus lotados, alguém discutindo com o cobrador, a mãe do motorista sendo xingada, seja ela quem for. E dependendo da sorte do dia (aos que acreditam em sorte), com trilha de alguma engaiolada do funk ou de bandas de forró em músicas sobre alcoolismo e um medo patológico de que a polícia apreenda seu paredão de som automotivo.
  Exceto pelo infeliz que não conhece a invenção dos fones de ouvido e longe de ser justificável, essa conduta é ao menos explicável. No fim, o que todos querem é proteger a si mesmo e aos seus, em meio a essa imensa selva de concreto que obriga cada um a seguir seu próprio olho e seu próprio dente. Embora isso seja um problema se você tem problemas de visão ou se acabar seu fixador de dentadura.
  E no meio de tudo isso, esquecemos que as pessoas são essência. E que são essencialmente feitas de histórias, que todos carregam e que às vezes sentem necessidade de compartilhar com alguém ao seu redor.
  Desse modo, aquele homem que desceu da condução em que estava, cabeça enfaixada, se arrastando sobre um pedaço de papelão, parou em frente a um grupo de pessoas que aguardavam o ônibus, começou a contar sua história. Tinha sotaque paulista, falava bem e sobre muitas coisas. Imagino que talvez tudo o que ele queria era ser ouvido. Mas acabou sendo ignorado, em parte pelo medo que nos ronda, proveniente desse mundo que anda hostil, assim meio à Los Hermanos, em parte por termos a tendência de nos trancarmos em nossa própria existência.
  Por conta disso não saberia dizer se proceder assim e recusar a história alheia, é certo ou errado. Até porque não sei se existe certo ou errado quanto a isso. O fato é que o homem tinha uma história para contar. Todos sempre tem uma história para dividir, dos vendedores de moldura ao pessoal da igreja que bate na sua porta domingo de manhã. Do Galvão Bueno (apesar de que realmente não saberia dizer se estaria disposto a ouvi-lo) a senhorinha que sentou ao meu lado no ônibus e passou boa parte do percurso contando a história da vida dela, apenas por me achar parecido com o neto dela, mesmo enxergando com apenas 20 % da visão.

  Mas quer escrevamos em blogs, quer andemos pelas ruas passeando com um cachorro que usa sutiã na cabeça, quer estejamos numa roda de amigos ou caminhemos pelo mundo sozinhos usando dreadlocks e vendendo aqueles brincos legais feitos com penas, teremos nossa própria peça teatral escrita e pronta para ser contada, embora muitas vezes não haja plateia. Principalmente se tratando do Galvão Bueno, eu acho.  

domingo, 9 de junho de 2013

Das Mais Novas Teorias Conspiratórias


  A humanidade é movida à mistérios. Quem somos, para onde vamos, como se forma um tornado ou como eu consegui tirar dez naquela prova mesmo errando três questões são perguntas que sempre instigaram e fizeram a civilização “progredir” rumo a algum lugar, mesmo que seja rumo ao seu próprio fim.
  E desse modo não demorou muito para que uma parte das pessoas que caminham sobre esse mundo pirado começassem a notar que nada é por acaso e assim certos eventos tidos como aleatórios passassem a ser questionados. É interessante investigar mistérios, bacana sair por aí montando quebra-cabeças, mas sempre haverá uma teoria conspiratória para tudo o que existe e por isso mesmo às vezes fica difícil conviver com tanta ideia muitas vezes espremida, puxada e encolhida para caber dentro de uma convicção qualquer, ao bel-prazer de alguém que apenas cansou de ver Discovery Channel e decidiu sair à caça  de suas próprias explicações para qualquer coisa.
  Assim, ocorre que tudo acaba sempre questionado. O sucesso das telenovelas, o fracasso da Seleção Brasileira, o atentado de 12 de setembro, o terrorismo da tv aos domingos, as pirâmides egípcias e a velhinha que passeia com o cachorro que curiosamente sempre acaba fazendo cocô em frente aqui de casa, tudo isso é engrenagem de uma peça muito maior, que sempre inclui você, quer queira quer não e faz de cada um alguém responsável e um pouco produtor daquela sujeira que o cachorrinho faz diariamente em frente à sua casa.
  Pensar sobre essa perspectiva é legal quando não há nada pra fazer, quando passando numa praça lotada de pessoas você é a única pessoa a qual o pombo capricha na mira ou naquele momento em que mesmo sentado lá atrás o professor pergunta numa sala de quarenta alunos pra você (e apenas você) se está compreendendo a matéria, quando na verdade estava voando tão longe que nem sabe ao certo o que o professor te perguntou e tem que arriscar um “sim” para ver se ele te deixa em paz. Mas em geral é mais confortadora a ideia de que nem sempre há alguém manipulando tudo o que acontece de bom ou ruim, que as lhamas ainda cospem na sua cara com precisão e vontade próprias, que se houver uma guerra entre homens e alienígenas poderemos sim ganhar, que o Galvão Bueno um dia irá pedir aposentadoria.
  Podemos ser apenas formigas numa caixa, o Planeta Terra pode até ser apenas mais uma bolinha de gude a vagar no universo, facebook pode realmente ser uma forma de alienação coletiva, esse texto pode apenas não existir, sendo lido em um tela que não existe, diante de você que pode simplesmente nem existir, não além de um grande programa de computador o qual eu chamarei de vida e os mais nerds de Matrix. E continua sendo estranho o fato de que naquela noite de sábado em meio a um feriadão, as lanchonetes no entorno do maior hospital de emergências da capital e talvez da região só estavam comercializando salgados de carne. Talvez tudo isso não faça sentindo algum, talvez tenha algum significado. De garantia eu não lanchei aquela noite. Alguém em especial pode muito bem achar semelhanças entre uma conversa tida num banco de shopping dia desses e essa postagem, mas no fim isso deve ser apenas parte de mais uma das mais novas teorias conspiratórias.

domingo, 19 de maio de 2013

Considerações Sobre O Tempo, Tempo Perdido, Tempo Que Passa Rápido E Tempo Que Simplesmente Não Passa

  Tempo. Essa ampulheta que segundo a segundo despeja seus grãos de areia no árido deserto que é a vida. Ele está sempre lá, rindo de você, como aquele colega de classe ria na 2ª série por você ter de apresentar um trabalho ridículo de dança, já que ficou doente no dia em que a professora pediu para formar as equipes e acabou junto com outras quatro meninas. E apesar de querer muito, não pode bater nele, porque é muito maior e mais velho que você. Esse menino valentão é o tempo.
  Tempo que sempre caminha na dualidade. A eterna corda-bamba temporal que o torna simultaneamente herói e bandido, professor que nunca falta a aula e reprova todo mundo e aluno que vem da coordenação do curso dizendo que o professor faltou mas deixou um recado avisando que todos que entregaram o trabalho passaram com 10 na média, água no deserto e banho frio numa manhã chuvosa de segunda. E esse relativismo sempre incomoda. O tempo às vezes voa quando por exemplo estamos com alguém especial, mas quando quebramos alguma vidraria que custa 3 meses de trabalho, parece parar e a hora de ver o seu chefe e assumir a burrada que fez parece não chegar nunca. Há ainda quem controle o tempo, porque quando aquela aula de cálculo começa, temos uma demonstração de como uma hora e meia pode demorar a passar.
  Acho que como tudo, o tempo se tornou mais caro. E sem moeda para pagar por ele, voa e passa cada vez mais rápido. Quando as únicas preocupações da vida são quando o Miojo vai aparecer no seu prato, quanto tempo falta para as férias de julho e a que horas vai começar Timão e Pumba, 24 horas até que são um tempo bem longo. A sensação que dá para sentir é que minutos e segundos também inflacionaram e assim como o salário mínimo e a convocação da Seleção para a Copa das Confederações, o tempo hoje não dá para nada, o que faz coisas realmente idiotas que fizemos há dois anos continuarem vivas, não por serem marcantes, mas pela sensação de que elas aconteceram ontem.
  E por tudo isso e sempre na espreita, temos o tempo perdido. Porque quando você diz a professora que o garoto da 2ª série anda te perseguindo, ele te espera na saída da escola. E tempo é algo muito precioso para se perder com decisões erradas, aulas de geometria analítica e shows de Tecno Brega. Precisamos sempre levar em consideração que tudo o que fazemos tem uma consequência e que somos arquitetos de nosso próprio futuro. E como arquiteto do meu futuro vou voltar a viver de macarrão instantâneo, logo assim que descobrir se algum canal ainda passa Timão e Pumba.

domingo, 12 de maio de 2013

Sobre Estresse, Lhamas e Dias Difíceis no Trabalho



As pessoas andam estressadas. Estresse que te faz discutir com o cobrador por ele te dar o troco da passagem errado, estresse pelo cobrador te dar o troco da passagem certo mas em moedas, estresse pelo dia que começou, pelo time que ganhou. Nesse mundo onde é cada vez mais difícil se entender, onde o salário parece ficar cada vez menor ante as necessidades das pessoas e todo mundo anda por aí com suas próprias nuvens negras para fazer chover e estragar esse elaborado penteado ao qual damos o nome de vida, relevar certos atos, praticar certas gentilezas e tentar não amaldiçoar a existência do colega de sala que fica com os pés balançando a sua cadeira a aula inteira, é algo difícil de se fazer.
  Todo mundo sempre é tão inclinado a ser amigável e prestativo enquanto as coisas não saíram do planejado e os imprevistos não viraram problema. Superiores sorriem para você no primeiro dia de emprego, colegas de trabalho dão a vez para você usar a pia, o cara da limpeza te diz que não é uma boa usar o último box do banheiro, não se quiser dormir hoje um sono tranquilo e sem pesadelos. Mas quando tudo começa a sair do esperado, quando certas coisas que nos são atribuídas começam a fugir a nossa alçada e seu chefe descobre que o Sedex não pode entregar uma lhama até o fim do dia para a festa de aniversário do filho do presidente da empresa, aí começa a desandar e todo mundo se estressa. Inclusive eu, porque além da ideia não fazer sentido, o cadastro da compra da lhama tem que ser feito no meu nome, o que além de uma bela sacanagem, configura tráfico de animais e maus tratos, porque lhama nenhuma do mundo vai resistir a 40 graus, 35 crianças e uma roupa de palhaço. Na verdade nem eu resistiria a tudo isso de uma vez.
  E fora do script fica complicado não se estressar. A nova conformidade das situações que não correspondem ao esperado irritam e ninguém tenta achar uma solução plausível, ninguém quer dar as mãos e cantar Kumbaya. E o seu problema se vê despejado no resto da sociedade. Uma sociedade que não tem culpa por você não ter puxado a cordinha na parada do ônibus, por alguém não ter puxado a cordinha no último box do banheiro, por existirem crianças mimadas que não entendem a diferença entre querer e poder ter uma lhama na sua festa de aniversário. Todo mundo já está tão preocupado em fazer seus próprios problemas serem os maiores problemas que não vão conseguir entender o lado alheio, mesmo quando ele necessita de tão pouco.
  Dias difíceis sempre irão existir. Todo mundo se irrita com certas coisas, muitas delas por ocorrerem em avalanche, quando tudo em volta já não vai lá muito bem. Nesses momentos, não se estressar é coisa quase impossível. Mas é importante ter em mente que o restante da humanidade não tem culpa por isso e que ter um dia ruim no trabalho não justificaria o carro novo do meu chefe todo cheio de arranhões, uma briga com o vendedor de cachorro-quente ou uma cuspida em alguém que aleatoriamente passa embaixo da janela. Sempre temos que ter em mente que todos tem suas próprias dificuldades e principalmente que comprar lhamas não faz parte das minha atribuições, então, na boa, não vou mais me estressar com essa história.

domingo, 5 de maio de 2013

Sobre Amizades, Amigos e Cervos Cósmicos


  O mundo está cada vez mais insano, mais individualista, mais consumista. As pessoas andam sempre tão focadas nesse ideal de sucesso que é ter um apartamento para a maresia corroer à beira-mar e uma geladeira que converse com você quando chegar em casa após um dia cansativo de trabalho. Lutar, vencer, batalhar, tudo isso é essencial na vida de qualquer ser humano, mas como tudo o que existe, é questão de dosagem. E a overdose disso podemos observar aí fora. A humanidade cada vez mais relutante em viver em sociedade, os computadores exercendo funções cada vez mais necessárias em nossa vida e a geladeira que além de conversar com você, te diz o que precisa comprar no supermercado e se vai chover amanhã, o que na minha opinião não a torna mais inteligente enquanto geladeira.
  E como consequência de tudo isso, as pessoas estão esquecendo de valorizar e praticar o exercício da camaradagem e do companheirismo, para se trancafiar em seu próprio mundo, teoricamente à prova de frustrações e fracassos. Viver em sociedade é formar laços, é interagir, é precisar e também ser útil a alguém. Afinal, se aquela galera barbada da Pré-História não tivesse tido a ideia de se reunir em grupo em torno de uma fogueira para contar umas histórias de terror, grafitar umas paredes de gruta e se defender de tigres dente-de-sabre, a humanidade não teria chegado até aqui.
  O que acontece é que todo mundo anda meio descrente, com um pé atrás na hora de dividir essa barra de chocolate por vezes amarga que é a vida. Mas amizade é essencial e ocorre de diversas formas. Pode ser a amizade que se forma entre pessoas que convivem diariamente, onde fica implícita uma dependência mútua, mas que ainda assim vai além dessa necessidade. Ainda que seja uma relação de companheirismo que traga em si certas implicações que incluem todo mundo faltando prova para ficar na pracinha conversando coisas sem nenhum sentido, a certeza de que mesmo que ninguém saiba nadar e que todos estejam no Titanic ainda assim ninguém vai ser capaz de ter uma conversa racional e coerente e é claro, o fato de que se emprestar uma caneta, vai precisar pedir muito para tê-la de volta, sabendo de antemão que ela vai voltar com a tampa toda mastigada.
  Ou o amor-amigo, essa loteria onde conseguimos alguém que nos entenda, dispostos a dividir momentos juntos, onde uma caminhada de mãos dadas conversando sobre semáforos é uma coisa indescritivelmente boa. E é claro, a amizade entre ser humano e animal de estimação, seja ele um felino como nome de médico alemão, o poodle do seu amigo que gosta tanto de você a ponto de tentar pinar na sua canela por uma tarde inteira, ou quem sabe uma bela relação de companheirismo com um cervo cósmico. O fato é que todas essas formas de amizade tornam a vida mais leve, mesmo carregando implicações e “poréns” que sempre vão valer as concessões que acabam sendo feitas, sendo sempre o caminho melhor do que ter que receber um sms da sua geladeira te mandando comprar mais açúcar, o que é muito estranho e assustador, já que você guarda o açúcar no armário. 

domingo, 28 de abril de 2013

Sobre Rotinas, Robôs e Pessoas No Trabalho Que Não Conhecem a Invenção dos Fones De Ouvido


  Uma coisa que a humanidade aprendeu a fazer foi sistematizar. Sistematizamos para garantir o mínimo de contratempos, de falhas, de parafusos fora do lugar. Sistematizamos para que no fim do semestre sejamos reprovados por nota e não por falta, porque ao que parece o coeficiente de rendimento cai menos. Até a morte funciona assim, do Holocausto na Segunda Guerra às filas dos hospitais públicos, das esteiras das fábricas onde os trabalhadores morrem lentamente montando peças que nem sabem para que servem à pinga boliviana que o seu Zé vende no boteco dele, que deve realmente ser uma ferramenta de extermínio, afinal quando a bola sai no meio do jogo de futebol, você nunca ouve o cara da publicidade dizer nada sobre cachaça da Venezuela, ou passa por um anúncio de beira de estrada com o Evo Morales segurando uma garrafa.
  Sistematizando estabelecemos uma rotina. A eterna queda de dominós diária, na qual a primeira peça que empurramos é o ato de arremessar o celular na parede por ter despertado assim tão rápido e que leva a um conjunto de outras ações que se não forem seguidas dentro de um padrão podem culminar com você correndo atrás de um ônibus no meio da chuva com uma camisa branca toda suja de café, mesmo que não goste de café.
  Rotinas são importantes. O mundo viraria uma bagunça bem pior do que um cara todo sujo de tinta dançando quadradinho em cima de uma picape parada em frente a um posto de combustíveis. Quando sabemos o que temos de fazer, podemos nos planejar para que tudo que está previsto para acontecer aconteça e assim, garantir que consigamos chegar em casa no fim do dia odiando quem come cheetos de queijo dentro do ônibus com ar-condicionado, mas ainda sim com a cabeça em cima do pescoço e em plenas condições de arremessar o que sobrou do celular na parede novamente quando o sol raiar no outro dia.
  O problema disso tudo é a tendência que a rotina nos impõe de parecermos cada vez mais com robôs. E que autômatos mais frágeis nós somos. Adoecemos mais fácil do que uma máquina que queima um circuito, com um conserto por vezes muito mais demorado e trabalhoso. Temos sentimentos para dosar. Sentimos raiva, alegria, fome (não que fome seja exatamente um sentimento), vontade de escrever um aviso numa cartolina e colar na cabine do colega de trabalho ao lado pedindo por favor que o mesmo compre um fone de ouvido que faça com que só ele e não a sala toda tenha que ouvir a coletânea de Summer Eletrohits todo dia, embora para fazer o cartaz eu teria que passar pelos corredores com a cartolina debaixo do braço e eu acho que ele é muito amigo do cara que tem as gravações do circuito interno de segurança. Sentimos medos, frustrações, traumas. Muitas coisas se somam nesse turbilhão de ideias que é a mente humana e que vão de algum modo interferir na rotina que a queda de dominós deu início quando o dia começou.
  A rotina também traz com ela uma certa dificuldade com eventos inesperados. E assim tudo vai transcorrendo como o habitual na sua manhã até que você distraído pisa com o sapato novinho em um cocô que espera de coração, seja de cachorro, descobre que comprou biscoito integral para o lanche sem se dar conta disso e além de ser mais caro acha que o pessoal não vai gostar, conhece pessoas de todo tipo, cai de avião próximo a alguma ilha deserta e distante da civilização, descobre o que te faz falta. Temos então de usar toda nossa capacidade de adaptação, temos uma nova rotina a estabelecer e com a qual brigar e que brigamos por valer a pena o resultado final, seja ele sobrevivência ou um sapato que não cheire a cocô. Por isso a vida deve ser feita de rotinas, rotina para se seguir e rotina para fugir. Porque se não for assim, vou preferir ser o C3PO e ficar escondido em algum planeta deserto, sem o boteco do seu Zé por perto para fazer seresta até as 3 da manhã do domingo e sem o cara dos fones de ouvido na cabine do lado.

domingo, 21 de abril de 2013

Sobre Timidez, Descascadores de Legumes E O Princípio Básico da Comunicação


  “O princípio básico é a comunicação”. E comunicar-se é em tese um processo simples. Gestos, palavras, comerciais ruins e textos de blogs sem nenhum temática bem determinada deveriam bastar para que nossa mensagem seja emitida e aceita pelo receptor. E com a linha de comunicação uma vez estabelecida, não há problema que não seja contornado, vontade que não seja compreendida e descascadores de legumes com 7 funções que não possam ser vendidos por aqueles camelôs, embora nesse ponto em especial a comunicação talvez falhe, porque eu nunca entendi as seis outras coisas que um descascador pode fazer além de descascar legumes.
  E tudo vai muito bem nessa sociedade interligada, que se comunica e divide experiências, até que você precisa sair de dentro do seu quarto e enfrentar o mundo lá fora, os motoristas de ônibus chatos, os professores que mesmo na faculdade vão até sua cadeira para ver o que você está fazendo e descobrem que ao invés de um plano de produção, tem várias e várias partidas de jogo-da-velha no seu caderno e colegas que riem de você por apresentar um seminário ruim, embora você tenha estudado bastante e saiba mais que qualquer um sobre o assunto.
  Você é uma pessoa esperta, racional e plenamente apta para enfrentar o mundo lá fora, mas fica tudo meio embaraçado pela timidez. Timidez tem seu aspecto positivo, é algo charmoso e difícil de se encontrar nessa sociedade onde muita gente prima por raspar as laterais da cabeça no zero e usar óculos que se utilizados como guarda-sol, poderiam abrigar uma família de quatro pessoas na praia em um dia quente. A questão é o quanto deixamos de nos expressar e de agir por conta dessa tal timidez. Essa sociedade que teoricamente baseia-se na comunicação não vai entender quando você gaguejar e esquecer o próprio nome em uma apresentação formal, que vai deixar as perguntas do professor serem respondidas por ele próprio, apesar de que você mesmo sabe todas as respostas, que vai te fazer deixar de reclamar quando pedir um pastel de frango e te mandarem um de camarão, ainda que você seja alérgico a camarão.
  Ser tímido faz com que muita coisa fique por dizer, ou pior, que seja dito errado. E assim, você de um leque imenso de possibilidades de iniciar uma conversa, só consegue dizer que viu um carro da Funerária Poupa Urna (porque realmente existe uma funerária com esse nome), leva falta porque não respondeu alto o suficiente o professor na hora da chamada e deixa de dizer o que sente por pura timidez. E muitas vezes encontramos do outro lado pessoas que tem um modo similar de comportamento, transformando tudo numa espiral infinita de cenas de feno rolando no deserto, o que torna a comunicação algo a ser trabalhado.
   Então por mais que seja difícil gritar quando perder o único ônibus no raio de 2 km que pode te levar pra casa, por mais complicado que seja dizer o que se pensa quando temos a certeza de que vale a pena, por mais complicado que possa ser ter aulas de inglês que te obrigam a falar uma língua estranha com pessoas que você só vê duas vezes por semana, devemos ir contra esses medos, começar a expor o que precisamos, perder o receio de acertar e de errar e principalmente de comprar aquele descascador de legumes. Esses pequenos instantes de hesitação guardam para si novas realidades, assim não tem jeito, é inalar essa bombinha de asma a qual chamamos de coragem e ir pra chuva se molhar, afinal, “é preferível a coragem a omissão”. 

domingo, 14 de abril de 2013

Do Conceito de Civilização e Dúvidas Acerca dos Parâmetros Medidores de Felicidade


  
Há quem diga que somos civilizados. Nos organizamos em Estados e eles fazem guerra. Inventamos aviões de controle remoto e eles evoluem até virarem armas. Criamos músicas e nos aparecem quadradinhos de 4, 8, 12, até parece comercial de sapataria no fim do ano. Criamos o cinema e aparecem remakes cada vez piores de bons filmes. Criamos sistemas produtivos que alimentariam os seres humanos da terra com sobras e no entanto milhões de pessoas padecem de fome todo ano. É, realmente somos muito civilizados.
  Caminhando por aí dá pra perceber o quanto tudo fica cada vez mais difícil. Quando vemos o motorista do ônibus brincar de molhar os pedestres que passam perto das poças d’agua, ainda sugestionado pelos amigos que dizem “molha aquele cara ali passeando com o poodle”, você percebe o quanto a humanidade vai mal. As pessoas perdem cada vez mais o senso de comunidade, ter a minha calçada inclinada para meu carro entrar na minha garagem é o que importa, logo não existe mais calçada nivelada. Cinco minutos de atraso são traduzidos como falta imperdoável, não importa o que passamos para chegar, o quanto corremos para que o atraso tenha sido só de cinco minutos. As pessoas iniciam relacionamentos para tentar suprir suas próprias carências e não estão preparadas para aceitar a aversão do outro a refresco em pó de uva. Tudo assim, tão individualista, onde o que não me serve não é bom o suficiente e deve ser deixado em segundo plano, mesmo que importe para outras milhares de pessoas.
  Daí eu vejo essa sociedade, onde crianças cospem nas cabeças de tiozinhos carecas da janela da sala de aula, onde cachorros são abandonados em estradas, onde torcer por times de futebol é motivo de morte e velhinhas não só recusam a sua gentileza de carregar as sacolas até o outro lado da avenida movimentada como saem gritando que você é o cara que roubou o celular do neto dela. Daí eu penso nas aldeiazinhas da Polinésia, onde não chegou o celular, não chegou a televisão, não chegou a energia elétrica. E penso que junto com tudo isso, também estão longes os golpes de dentro dos presídios, o Domingão do Faustão, as armas de fogo. Alguns dos povos considerados os mais felizes do mundo inteiro tem que andar quilômetros carregando um cesto com excrementos humanos nas costas. E nós aqui, vivendo em meio a civilização, preocupados em não deixar sobra de comida no prato pra não pagar mais caro no self-service, tentando lembrar onde estacionamos o carro e sem saber que horas vamos conseguir chegar em casa com esse trânsito.
  Por tudo isso, provavelmente estejamos indo mal. Embora não dê pra generalizar essa grande bola de problemas que é a humanidade, há certos pontos que a modernidade mais ajuda que atrapalha. E enquanto existirem pessoas que param o carro para você passar em ruas movimentadas, mecânicos que não trocam a rebimboca da parafuseta a não ser que seja realmente necessário e serviços de assistência técnica que realmente aparecem dentro do horário previsto, ainda há esperança, embora sejam peças cada vez mais raras de se ver, quase folclóricas. E eu também serei agradecido a esse modelo civilizatório que não me deixa andar 5 quilômetros com um cesto de excrementos, porque na boa, não precisa medir a felicidade por aí. 

domingo, 7 de abril de 2013

Sobre Medo De Tentar, Traumas E Mula Sem Cabeça Feita de Jornal


  Todos temos nossos próprios medos. Medo de tentar, medo até de conseguir, de se arriscar, de ter que fazer outro trabalho vestido de mula-sem-cabeça em trajes de jornal, de se apaixonar, de perder dinheiro, de ir jantar com colegas e perceber que eles saíram correndo na hora de pagar a conta, medo de que você não tenha recursos suficientes para sair dessa sozinho porque seu medo anterior de perder dinheiro se realizou. E é tanta coisa para assustar que dá medo até de ter medo.
  Uma parte disso vem de um desejo de auto proteção, afinal o mundo está ficando um lugar complicado de se viver e todo aquele blá blá blá coberto de razão que a gente sempre fala quando vê alguém arremessar uma garrafa pet cheia de urina num velhinho bêbado ziguezagueando a rua e praguejando com o amigo invisível dele em voz alta, faz sentido e nos faz redobrar cuidados.  Mas uma outra parte disso se origina justamente dos nossos traumas, das nossas experiências negativas, dos nossos desacertos, daquela vez em que eu fiquei em casa ao invés de ir pra aula do professor que sempre falta e ele não só apareceu como também aplicou uma prova surpresa muito fácil. Somos assim, dados a avaliar nossos históricos e pesar acontecimentos tentando sempre gerar um ciclo de repetição constante. E é justo daí que vem as maiores perdas, os maiores enganos, que deixamos de viver novos grandes momentos. Perdemos de conhecer continentes para ficar dando voltas no riacho perto de casa com nossas naus.
  Porque ao iniciarmos uma empreitada rumo ao desconhecido, podemos de fato terminar jogados aos tubarões ao sermos surpreendidos em um motim no meio da noite, existe sim a chance de pegar escorbuto ou de perder metade dos dentes devido a alguma febre tropical, afinal isso acontece o tempo todo. Mas em contrapartida a tudo isso, existe a possibilidade também de descobrirmos novos paisagens, ter novas vivências e descobrir um pessoal humilde e ingênuo a ponto de trocar coisas legais por um punhado de espelhos (a sacanagem que fizeram com os índios deixamos para outra postagem histórica mais a frente).
  O fato é que viver tem desses dois lados. Experiências ruins estão sempre a nos rodear como fantasmas, nos impedindo de ver a real dimensão do que poderíamos ter conseguido ao tentar, tudo em nome de uma comodidade por vezes tão incômoda. Realmente é preferível a coragem a omissão, mas às vezes a gente custa bastante a reunir a tal coragem suficiente para sair do que nos assusta. E era isso que devia assustar.
  Então, por mais que caravelas afundem, por mais que certas ideias muito boas tenham se tornado fiascos completos, por mais que assistir Ted no cinema tenha sido um dos maiores prejuízos financeiros que eu tive com filmes na minha vida, nada pode ser contado como motivo para deixarmos de fazer, ou de refazer se for o caso. É preciso lutar contra o que nos assusta. E tia Vilma, na boa, um dia desses vai ser você quem vai derreter dentro de uma roupa de jornal em alguma semana cultural sobre folclore porque essa vida é louca e incerta. E eu vou estar lá. Sem ressentimentos.